quarta-feira, 23 de novembro de 2011

A Revolução Quântica - Parte III

Nota introdutória:
Quando estava a preparar este novo post pensei: Como poderia avançar na Física do século XX sem dedicar um post ao annus mirabilis e a algumas contribuições científicas de Albert Einstein? Devido a esse facto, dedicarei este post a essa mente brilhante da Física do século XX: Albert Einstein.
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Os primeiros e difíceis anos

Passados actualmente 56 anos sobre o seu falecimento e 106 anos sobre a extraordinária época, de apenas alguns meses, ao longo dos quais divulgou 5 investigações científicas que agitaram irremediavelmente a Física até então conhecida. Einstein foi um homem único que forneceu tributos revolucionários ao progresso da Ciência, foi um cidadão com um empenhamento cívico digno de nota e, pelo seu carácter, converteu-se num ícone popular. A sua vida, o seu universo e a sua obra devem ser reconhecidos e lembrados.

Nasceu numa sexta-feira, às 11:30 do dia 14 de Março de 1879 na cidade alemã de Ulm. Inicialmente, Pauline e Hermann – os seus pais – decidiram chamá-lo de Abraham – o nome do seu avô paterno. Porém, acharam esse nome demasiado judeu e, por isso, decidiram manter a inicial “A” e passaram a baptizá-lo como Albert Einstein. A sua origem, tanto paterna, como materna era judia e os seus pais pertenciam à classe comerciante alemã.

Com apenas 1 ano de idade, ele e a sua família mudam-se para Munique onde Albert passaria a sua infância até aos seus 16 anos de idade. Depois de completar 16 anos, por vontade própria, deixou Munique e mudou-se sozinho para a Suíça, para poder estudar no Instituto Politécnico de Zurique, no qual se formou em 1900 com grau de licenciado. Em 1901, renegou à cidadania alemã, para assim esquivar-se do serviço militar obrigatório, e obteve a nacionalidade suíça. Foi igualmente neste país que A. Einstein concluiu o seu doutoramento, em 1905.

Como não conseguiu vaga académica para continuar as suas funções, teve que partir para o mercado de trabalho, tendo sido admitido no ano de 1902 no Serviço de Patentes Suíço – em Berna – como terceiro oficial. Foi sempre um trabalhador capaz e desempenhava as suas funções com competência. Mas, acima de tudo, este período serviu para que Einstein pudesse preparar, amadurecer e escrever os artigos que publicou em 1905 – annus mirabilis – e que lhe renderam o reconhecimento e louvor científico mundial.

Annus mirabilis

Einstein era um homem ciente da importância do mundo como espaço para o desenvolvimento do conhecimento empírico. Foi um reconhecido perito de patentes e analista, foi também inventor e co-autor de pesquisas de natureza experimental. Apesar de ser conhecido pelas suas experiências conceptuais como forma de apresentar o seu processo de exposição e descoberta, todo o seu trabalho revela uma capacidade teórica muito fundeada na observação empírica.

Por muito que na actualidade pareça evidente, a realidade é que no começo do século XX ainda era muito discutida a descontinuidade da Natureza, e essas discussões advinham desde a existência por si só dos átomos, até ao mais polémico assunto dos corpúsculos de radiação. Esses assuntos não eram aceites pela maioria da comunidade científica. E, de certa forma, essa atitude é justificável visto que o avanço científico do século XIX nas disciplinas de Óptica, Termodinâmica e Electromagnetismo se deveu invariavelmente ao facto de se considerar a matéria e a energia como entidade contínuas. Muitos dos fenómenos que hoje conhecemos e muita da tecnologia que hoje utilizamos nasceu a partir desse paradigma. Está claro que sempre existiram algumas dúvidas mas nunca a ponto de questionar o mais básico dos pressupostos: a (des)continuidade da matéria e da energia.

Apesar de pessoas mais desatentas atribuírem a Einstein a descoberta do efeito fotoeléctrico, não foi isso que aconteceu. O efeito fotoeléctrico foi pela primeira vez observado em 1839 por Alexandre Becquerel mas essa descoberta não foi alvo de grande interesse ou divulgação pois para os cientistas da época não oferecia qualquer tido de utilidade. Einstein ao interpretá-lo e descrevê-lo pelas suas leis (que posteriormente viriam a ser verificadas) revolucionou por completo a ciência, visto que forneceu sustentação científica à hipótese originalmente formulada por Planck (em 1900) de descrever o espectro de emissão de luz por corpos incandescentes dividindo a energia em partições definidas.

Em 1905 Einstein concebe assim a Natureza como sendo constituída por corpúsculos. Mas ele não restringe esta concepção apenas à matéria visto que ele concebe a natureza corpuscular da absorção, emissão e propagação da luz em partículas que conteriam uma quantidade energética elementar relacionada com a cor da respectiva radiação.

O atrito que esta nova ideia provocou entre a comunidade científica devia-se ao facto de que esta teoria contrariava aparentemente a teoria ondulatória da luz que, ao longo do século XIX, obteve o seu expoente máximo de sucesso na interpretação quer qualitativa, quer quantitativa dos fenómenos luminosos. Só mais tarde é que estes “pedaços” de energia foram denominados de fotões e a sua existência tornou-se inquestionável nomeadamente depois do estudo de fenómenos conhecidos tais como o efeito Compton que apenas era explicado com a teoria corpuscular da radiação.

A relatividade especial

O ano de 1905 foi realmente muito produtivo para Einstein. Logo após se debater com as questões relacionadas com a luz e a sua natureza, Einstein inicia nesse mesmo ano aquela que viria a ser a maior revolução no pensamento científico do mundo. Ainda em 1905 ele idealiza uma experiência mental muito simples com comboios em movimento para explicar aquela que viria a ser chamada de Teoria da Relatividade Especial. Basicamente essa experiência mental pode ser resumida do seguinte modo: suponhamos que a berma da via-férrea é atingida por raios de dois pontos distantes, A e B. Se afirmarmos que ocorreram simultaneamente, o que significa isso?

Einstein percebeu que precisamos de uma definição operacional, uma definição que se possa efectivamente aplicar, e que tal exigiria ter em conta a velocidade da luz. A sua resposta foi que definiríamos os dois raios como simultâneos de estivéssemos parados exactamente a meio caminho entre eles e se a luz de cada um chegasse até nós no mesmíssimo momento.

Mas agora imagine-se que o evento seria visto por um passageiro de um comboio que se move rapidamente pela linha férrea do ponto A para o ponto B. Suponhamos que, no preciso instante em que o raio atingiu os pontos A e B, havia um passageiro no meio do comboio que tinha acabado se passar pelo observador que estava a meio caminho na berma da via-férrea. Se o comboio estivesse em repouso em relação à berma da via-férrea, o passageiro que se encontrava no interior veria os relâmpagos em simultâneo, à semelhança do que sucederia com o observador na berma da via.

Mas, se o comboio estivesse em movimento para o ponto B, o observador no interior estaria a dirigir-se para o ponto B enquanto os sinais luminosos viajavam. Portanto estaria posicionado ligeiramente mais próximo do ponto B no instante em que a luz chegasse e, por conseguinte, veria a luz do raio no ponto B antes de ver a luz do raio do ponto A. Como tal, afirmaria que os raios não tinham sido simultâneos.

Esta ideia simples, mas radical, significa que não há tempo absoluto e que a questão da simultaneidade só é verdade para o referencial em estudo. A partir deste ponto, Einstein estava pronto para escrever um dos seus artigos mais famosos: “Sobre a Electrodinâmica dos Corpos em Movimento”. Neste artigo ele mostra que, no fenómeno de indução electromagnética, um magneto e uma bobina induzem uma corrente eléctrica apenas baseada no seu movimento relativamente um ao outro. É importante anotar aqui que desde os tempos de Faraday que haviam duas explicações teóricas diferentes para a corrente produzida, dependendo de o magneto ou a bobina estarem em movimento.

E = mc2

Poderíamos pensar que o trabalho “Sobre a Electrodinâmica dos Corpos em Movimento” estava concluído com esta nova abordagem relativista. Porém, Einstein não se deixou ficar. Em Setembro de 1905 publicou aquela que viria a ser a equação mais famosa de toda a ciência. Einstein desenvolveu a ideia com uma gigantesca simplicidade. Em apenas três páginas, remete-se ao seu artigo sobre a relatividade especial e declara: “Os resultados de uma investigação electrodinâmica recentemente publicada por mim nesta revista levaram-se a uma conclusão interessante, a qual será aqui abordada.”

O resultado foi uma conclusão elegante: a massa e a energia são diferentes manifestações da mesma coisa. Há um intercâmbio fundamental entre elas. Como Einstein disse no artigo, “a massa de um corpo é a medida do seu conteúdo de energia”. Utilizou, ao contrário do que muitos pensam, a equação L=mV2. Até 1912 Einstein utilizou a letra L para representar a energia e o V para representar a velocidade da luz.

O passo até à relatividade geral

Não bastou para Einstein este gigantesco passo. Isto porque, na realidade, a sua teoria apenas era válida para referenciais a velocidades constantes. Não fazia parte da maneira de ser de Einstein deixar trabalhos científicos a meio. E, por isso, iniciou logo depois a sua busca por algo muito maior: a generalização da sua teoria da relatividade especial. Em 1907 ele faz a primeira aproximação à teoria da relatividade geral. Ele equiparou a movimento inercial o movimento de queda livre, alegando que as leis da relatividade especial deviam, pelo princípio da equivalência, ser as mesmas. Assim ele previu o fenómeno da dilatação gravítica do tempo e em 1916 enunciou de forma sistemática a teoria da relatividade geral, segundo a qual uma massa distorce o tecido espaço-tempo, ditando assim as leis do movimento relativo.

Essa teoria provou posteriormente ser a solução de imensos problemas na cosmologia. Por exemplo, resolvendo as equações da teoria da relatividade geral para o interior de uma estrela verificou-se que se a massa da estrela fosse comprimida num espaço suficientemente pequeno os cálculos pareciam entrar em colapso; e calculando para o centro da estrela, o espaço-tempo iria curvar-se indefinidamente sobre si mesmo. Para o nosso Sol, isso aconteceria se toda a sua massa fosse comprimida num raio inferior a três quilómetros. Numa situação dessas, nada que estivesse dentro desse raio conseguiria escapar à força gravítica, nem sequer a própria luz ou outra forma de radiação. Estes cálculos foram os precursores da descoberta de buracos negros. Porém, é digno de nota que Einstein não acreditou, nem na altura nem depois, que os resultados correspondessem efectivamente à realidade.

Mas como provar a teoria da relatividade geral? A teoria era muito abstracta e carecia, está claro, de verificação empírica, o que era muito difícil porque os efeitos que ela produzia eram extremamente pequenos quando comparados com a capacidade de observação naquela época. A precessão do periélio de Mercúrio foi o seu primeiro e imediato teste. O segundo foi o desvio de um feixe de luz na vizinhança e sob a influência de um corpo maciço; este teste foi feito sobre a observação do movimento de estrelas na vizinhança aparente do Sol, por ocasião do eclipse solar total de 1919. Arthur Eddington foi o grande promotor das expedições para o efeito realizadas pela Royal Astronomical Society de Londres, na Ilha do Príncipe e em Sobral no Brasil, cujos resultados suportaram as previsões da teoria e contribuíram para a sua aceitação internacional. A teoria da relatividade geral ganhou rapidamente grande alcance científico e filosófico, dado que ela é o suporte em que se formulam os modelos cosmológicos, e por consequência, se firmam os avanços da Cosmologia.

Outros feitos

Pouco mais tarde (1917), estudando a interacção da luz com a matéria, Einstein previu o fenómeno da emissão estimulada de radiação, um fenómeno discreto que passou relativamente desapercebido, até que foi pela primeira vez utilizado para amplificar a intensidade de um feixe de micro-ondas mediante uma cavidade reflectora em ressonância — “maser” (inventado por Charles Townes em 1954). Após o que, físicos e engenheiros, inventaram diversos dispositivos capazes de emitir intenso feixes paralelos de luz coerente – os “laser”, que são poderosos instrumentos de investigação e encontraram múltiplos domínios de aplicação.

Em 1924, em correspondência mantida com Satyendra Bose, Einstein concebeu um novo estado da matéria, constituído por um “condensado” de átomos a temperatura extremamente baixa, que exibiria superfluidez e coerência de movimento (análoga à coerência da luz laser). Este estado só viria a ser realizado em laboratório pela primeira vez em 1995, em Boulder na Universidade do Colorado, com o auxílio de campos magnéticos e lasers utilizados na contenção e arrefecimento de um vapor metálico, quase imobilizando os átomos que ficam constrangidos a movimento sincronizado, atingindo então o estado denominado “condensado” de Bose-Einstein.

Baseado no livro:
ISAACSON, Walter (2008). Einstein – A Sua Vida e Universo. Alfragide: Casa das Letras, Edição 10 07 0077.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

A Revolução Quântica - Parte II

A ideia (de Planck) de que a energia tem de estar quantificada em pacotes bem definidos tinha tanto de elegante como de impensável. Ao longo do século XIX nunca ninguém tinha posto em causa a súmula do saber científico. No entanto, bastou correr o primeiro ano do novo século para que tudo mudasse na Física. No entanto, foram as propostas de Planck que estiveram na base das mais maravilhosas explicações em Física.

Uma das mais espantosas explicações relacionadas com essa nova abordagem da Física foi proposta do Albert Einstein - a explicação do efeito fotoeléctrico. A primeira vez que o fenómeno foi observado experimentalmente foi em 1839, pelo físico francês Alexandre Becquerel. Estranhamente, quando se fazia incidir luz ultravioleta em metais, verificava-se a produção de corrente eléctrica. A experiência de Becquerel foi confirmada, em 1887, pelo alemão Heinrich Hertz,  que mediu faíscas causadas pela incidência de radiação ultravioleta entre placas   e pelo britânico Joseph Thomson.

Alexandre Becquerel

Sempre se notou que o fenómeno ocorria quando era utilizada radiação ultravioleta, porém, quando se utilizava luz vermelha, por exemplo, tal fenómeno não era verificado experimentalmente. Em certo sentido, parecia que era necessário atingir uma certa frequência para que o fenómeno ocorresse ou, dito de outra forma, era necessário uma energia mínima para que o efeito fotoeléctrico se verificasse. O saber científico dos físicos do século XIX terminava aqui. Quando era necessário explicar o mecanismo através do qual o efeito sucedia, havia um enorme vazio científico.

No entanto, um modesto avaliador de patentes do Gabinete Suíço de Patentes haveria de mudar o rumo da história. Em 1905, no annus mirabilis de Albert Einstein, este teve uma ideia radical para explicar o efeito fotoeléctrico. Einstein imaginou que poderia ousar tratar a luz da mesma maneira que Planck tratou a energia. Assim como Planck propôs que a energia estava finamente dividida em pacotes definidos (os quanta), Einstein propôs que a luz também pudesse estar dividida em pequenos pacotes energéticos (aquilo a que viria a ser chamado mais tarde de fotões).

Albert Einstein

Desta forma elegante, Einstein disse que cada fotão transporta consigo uma determinada energia, que é função da sua frequência, e que um fotão arranca um e um só electrão. Ora, fotões de frequências mais baixas possuem uma energia mais baixa e, por isso, não conseguiam arrancar o electrão da superfície do metal. No entanto, quando se aumentava a frequência dos fotões emitidos, a sua energia era superior e, como consequência, havia energia suficiente para arrancar o electrão da superfície do metal. O excedente energético era compensado pela energia cinética do electrão extraído ao metal.

Esquema do mecanismo do efeito fotoeléctrico

Esta ideia era sublime e invulgarmente radical. No entanto, ela foi encarada durante muitos anos com descrença pela comunidade científica. Einstein tinha, com a sua proposta de explicação do efeito fotoeléctrico, abalado um dos pilares da Física do século XIX  a radiação era considerada de natureza puramente ondulatória.

Todavia, a ideia de Einstein começou, aos poucos, a ser aceite devido a sucessivas experiências que comprovavam a sua explicação radical. Este foi o trabalho que valeu a Albert Einstein o Prémio Nobel da Física em 1921.

Mas, será que os físicos ficaram satisfeitos com a ideia de que a luz era um conjunto de partículas, ao invés de uma onda? Como explicar os efeitos ondulatórios da luz, face a estas novas constatações? Isso são matérias que serão consideradas em "A Revolução Quântica – Parte III".

Baseado no livro 50 Ideias De Física Que Precisa Mesmo De Saber de Joanne Baker.

domingo, 13 de novembro de 2011

A Revolução Quântica - Parte I

Nota introdutória:
Este post do blog fará parte de um conjunto de publicações sobre algumas circunstâncias históricas que providenciaram a "revolução quântica" na Física do século XX.
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O século XX, o século da revolução da Física, iniciou-se com um choque gigantesco! Um físico alemão propôs algo impensável. O seu nome era Max Planck (1859-1947) e é, ainda hoje, considerado o pai da física quântica. Enquanto jovem, Planck nutria dois grandes gostos: a Música e a Física. No entanto, em ambas as áreas, os seus professores aconselharam-no a afastar-se. Note-se que, especificamente no caso da Física, pensava-se que o trabalho de descoberta estava feito (nas palavras de alguns, apenas seria necessário aperfeiçoar resultados experimentais já obtidos). No entanto, e felizmente para todos nós, Planck decidiu enveredar pelos sinuosos caminhos da Física e embrenhar-se numa forma de pensar ciência completamente diferente do, até então, pensamento puramente clássico.


A proposta da Planck surge das várias tentativas para explicar porque a radiação emitida por qualquer objecto obedecia sempre a um mesmo padrão, independentemente da substância em teste (a radiação de corpo negro). A investigação resultava do facto de que a maior parte da radiação proveniente de um objecto era irradiada numa frequência muito específica. No entanto, ao variar a temperatura desse objecto, a frequência a que ele emitia também se deslocava.

Muito embora os cientistas tivessem efectuado todas as medições que respeitavam aos gráficos da radiação de corpo negro, existiam somente explicações parciais para o fenómeno (propostas por Wilhelm Wien, Lord Rayleigh e James Jeans). Tanto a proposta de Wien (válida em frequências próximas do azul) como a proposta de Rayleigh e Jeans (válida em frequências próximas do vermelho) falhavam quando se caminhava para os extremos do espectro electromagnético. No caso específico da proposta de Rayleigh e Jeans, o seu modelo previa a libertação de uma quantidade infinita de energia quando um objecto emitisse no ultravioleta ou acima (uma falha convenientemente denominada de "catástrofe do ultravioleta").

Planck, por outro lado, não procurou modelos físicos e matemáticos que se adequassem ao observado nas experiências. Este investigador era uma apaixonado pelo purismo da Física e, por isso, desenvolveu uma teoria baseada nos princípios físicos básicos por trás do calor e da radiação. O fascínio pelas propostas inovadoras de Rudolf Clausius (a existência de uma nova grandeza universal, a entropia) e pelas elegantes equações de James Maxwell (que relacionavam campos eléctricos com campos magnéticos) permitiu a Planck desenvolver uma nova teoria que relacionava dois campos até então muito distintos.

O espírito de Planck sugeriu-lhe que deveria seguir o seu instinto matemático e chegar a conclusões que poderiam não ser aceites imediatamente pela comunidade científica. Para isso, ele teve que tratar a radiação como um conjunto de pequenos osciladores electromagnéticos. No fundo, Planck tratou matematicamente a radiação como se fossem pequenas partículas (a mesma maneira como os especialistas de termodinâmica tratavam o calor).

Esta era uma abordagem revolucionária e de difícil explicação. Todavia, Planck não se limitou a admitir um resultado que pudesse passar pelo crivo das grandes mentes mundiais. No seu esforço de conseguir concordância matemática, Planck teve que admitir que a energia apenas existia em pacotes definidos (os quanta). Além disso, essa energia deveria ser proporcional à frequência da radiação e afectada de uma constante de proporcionalidade invariante.

Ao estender o cálculo dos vários osciladores electromagnéticos possíveis à probabilidade da sua existência, Planck verificou que o cálculo coincidia com o espectro de corpo negro. Assim, em 1901, Planck abre o século XX com a publicação que conectava, pela primeira vez na história, a radiação com a probabilidade. Esta nova abordagem, além de resolver a "catástrofe do ultravioleta", justificava o espectro de corpo negro.

Foi semeada, nesse preciso momento, uma revolução na Física e desde 1901 esta disciplina nunca mais seria a mesma.

Baseado no livro 50 Ideias De Física Que Precisa Mesmo De Saber de Joanne Baker.

domingo, 6 de novembro de 2011

Porque a brincar também se aprende

Saudações a todos os leitores.

Este novo post tem como objectivo mostrar que a física dos movimentos não tem que ser trabalhada apenas com giz e quadro.

Este jogo, uma criação inédita de Matthew Blackman, permite variar a posição inicial, a velocidade e a aceleração do objecto em questão.

O objectivo é fazer corresponder o movimento do objecto com o gráfico previamente proposto.

Divertido e formativo.

Aproveitem!

Disponível em:
AQUI

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Uma reflexão sobre a entropia


A entropia consiste numa medida da “dispersão”, ou “espalhamento”, da energia de um sistema termodinâmico. Esta é uma definição baseada no conceito estatístico de entropia. Este espalhamento é relativo a todas as configurações microscópicas compatíveis com a energia do sistema.[1] Numa leitura baseada na teoria da informação, a entropia é uma medida da falta de informação acerca da configuração interna de um sistema, visto que quanto maior é o número de microestados possíveis, menor é a informação que se dispõem da constituição microscópica do sistema.[1]

O conceito de entropia foi proposto pelo alemão Rudolf Clausius (1822-1888) que estabeleceu as pedras basilares da Termodinâmica. Depois do conceito de energia ter sido firmemente estabelecido (deixando para trás a fragilizada vis viva), o que lhe permitiu enunciar a lei da conservação da energia, Clausius decidiu propor algo idêntico ao que tinha feito com a energia. Ele sugeriu que as variações de energia e de temperatura (sendo esta definida, como sempre, pela leitura de um vulgar termómetro) constituíam apenas, e também, duas variedades da mesma coisa – variações de entropia.[2] Clausius explicou o porquê da palavra entropia: “Construí intencionalmente a palavra entropia de modo a ser tão semelhante quanto possível à palavra energia, pois as duas grandezas … encontram-se de tal modo unidas no respetivo significado físico que se afigura desejável uma certa semelhança de designação”.[2]


A entropia é, na maioria das vezes, relacionada com o grau de desordem do sistema.[3] É comum utilizarem-se exemplos como: Um pacote de esparguete cru tem entropia baixa porque exibe uma grande ordem; quando se atira o esparguete para dentro de um tacho com água a ferver e este se mistura todo, el fica mais desordenado e, portanto, com maior entropia.[4] No entanto, esta analogia para a compreensão da grandeza física entropia é enganadora.

Tome-se como exemplo uma cristalização endotérmica de uma solução sobressaturada. Se colocar esta solução num recipiente adiabático, espontaneamente, deverá ocorrer a formação de núcleos de cristalização do soluto. Ora, este fenómeno sugere uma diminuição substancial da “desordem”. Além disso, numa cristalização endotérmica (como no caso de soluções sobressaturadas de sulfato de sódio) verifica-se uma diminuição de temperatura do vaso reacional, o que sugere uma diminuição da “desordem”. Contudo, se este fenómeno é espontâneo e colocado num sistema reacional isolado, a entropia do sistema deve necessariamente aumentar. Assim, uma argumentação baseada na “desordem” do sistema revela-se deficiente aquando da explicação de certos fenómenos químicos.[1]

Assim, uma interpretação preferível deste termo passará, necessariamente, pela noção dada pela Termodinâmica Estatística[3] (referida no início do artigo). Desta forma, uma analogia correta à real noção de entropia pode ser feita.[1] Considerando um país (sistema), com N habitantes (entidades elementares), onde se vai estudar o “estado” do dinheiro (energia), isto é, a sua distribuição pelos habitantes e as formas assumidas por esse dinheiro.

Dada a intensa transação comercial, as distribuições possíveis do dinheiro pelos habitantes são inúmeras. Contudo, ainda que se consiga uma distribuição mais provável do dinheiro pela população, este pode estar sob diversas formas: seja em numerário, contas bancárias ou cheques. Assim, no que respeita ao dinheiro de cada indivíduo, este pode encontrar-se sob diferentes condições (aquilo a que em Termodinâmica Estatística se designa por degenerescência). Neste caso, o conjunto de microestados do sistema é imenso.

Contudo, se o banco central fornecer o dinheiro de uma forma muito ordenada (todos com a mesma quantia ou uns poucos com todo o dinheiro), as transações encarregar-se-iam de espalhar o dinheiro pelos indivíduos e pelas diferentes formas que este pode tomar. Desta forma, o número de microestados diferentes para o dinheiro do país maximizar-se-ia, assim como a entropia de um sistema tem que ser maximizada.
                                                                      
Referências:
1.     J. P. M. Ferreira, “Como interpretar a entropia?” Química-Bol. SPQ 96 (2005), 38-42.
2.     M. Guillen, Cinco Equações Que Mudaram o Mundo, 3ª edição, Lisboa: Gradiva Publicações, 1995, ISBN: 972-662-614-5.
3.     F. L. Lambert, “Shuffled Cards, Messy Desks, and Disorderly Dorm Rooms – Examples of Entropy Increase? Nonsense!” J. Chem. Educ. 76 (1999), 1385-1387.
4.     J. Baker, 50 Idéias Que Precisa Mesmo De Saber – Física, 1ª edição, Alfragide: Publicações Dom Quixote, 2011, ISBN: 978-972-20-4707-4.