sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Uma pequena lição sobre chocolate


O chocolate, como sabemos, é um alimento proveniente do o cacau, a semente do fruto do cacaueiro, planta tropical de nome Theobroma Cacao. Theobroma significa “alimento dos deuses”, e é isso mesmo o que o chocolate é para quase todos nós.

O chocolate, tal como actualmente o conhecemos, é basicamente formado por finos fragmentos de pó de cacau espalhados em manteiga de cacau. Para além destes constituintes, contém ainda outras gorduras, emulsionantes (normalmente lecitina), açúcar e baunilha.

O cacau e a manteiga de cacau são obtidos a partir da semente do cacaueiro e eram usadas pelos Maias e Astecas para fazer uma bebida muito revigorante, e até considerada afrodisíaca, a que davam o nome de "Xocolatl" (xocoll = amargo e atl = água).

As partículas de cacau têm uma cor escura e um sabor intenso. A manteiga de cacau, por outro lado, equilibra com uma consistência cremosa e uma particularidade ímpar do chocolate, o facto de transitar, na boca, de um sólido aromático a um líquido acetinado. Isto acontece porque a manteiga de cacau tem um ponto de fusão bem definido, que corresponde sensivelmente à temperatura do corpo humano. A temperatura do nosso corpo é a ideal para o fundir e ele transforma-se num líquido denso, que liberta aromas quase inebriantes. E visto que, para poder derreter-se, qualquer substância retira calor ao meio ambiente, sentimos ainda uma agradável impressão de frescura na nossa boca.


Diversas substâncias cristalizam em formas dissemelhantes, e cada uma dessas formas tem características bem estabelecidas. A manteiga de cacau pode cristalizar em seis formas diferentes. O interessante é que somente uma delas é a mais aconselhada para se conseguir um chocolate com a textura ideal. Assim, para obter um chocolate de qualidade, deve evitar-se a presença das outras formas cristalinas. Isso alcança-se com uma verificação exigente das temperaturas de fusão e uma série de truques para que as moléculas que produzem a manteiga de cacau cristalizem na forma que admita obter um chocolate com as particularidades pretendidas. A este método atribui-se o nome de temperar o chocolate. Fazer um bom chocolate não é, por isso, uma tarefa fácil. Requer bastante experiência e conhecimentos!


A manteiga de cacau funde a cerca de 35 ºC e algumas das outras gorduras do chocolate a uma temperatura ligeiramente superior, mas nunca acima de 48 ºC. Se permitirmos que o chocolate atinja uma temperatura de cerca de 54 ºC, ele separa-se em manteiga de cacau, um líquido amarelado, e em partículas de cacau queimadas. Este processo é irreversível e torna o chocolate impróprio para uso. Assim, o chocolate deve ser derretido de forma lenta e a temperatura não deve exceder 49 ºC.


Enquanto vai derretendo, o chocolate deve ser mexido para manter a temperatura tão uniforme quanto possível. É também importante que tenha sido partido em pedaços mais ou menos da mesma dimensão e, de preferência, pequenos. Pedaços maiores levam mais tempo a derreter e os mais pequenos, entretanto, podem ficar queimados.

Conforme o livro "A cozinha é um laboratório" de Margarida Guerreiro e Paulina Mata
(Mas com aperfeiçoamento de português...) diHITT - Notícias

terça-feira, 25 de outubro de 2011

A história do Post-it


Quem disse que as coincidências em ciência não são boas? Muitas descobertas em Química foram resultado de puros acidentes ou coincidências. É o caso do tão famoso Post-it.

No ano de 1968 um químico de nome Spencer F. Silver, que trabalhava na empresa 3M, estava a trabalhar em adesivos sensíveis à pressão quando se deparou com um pormenor bastante curioso.


Ele descobriu que produzindo um co-polímero de acrilato de uma determinada forma, formava-se uma suspensão de microesferas ligadas entre si. Estas microesferas eram insolúveis na solução resultante da sua produção e inchavam até duplicar o seu diâmetro original. A cereja no topo do bolo é que quando se pulverizava a substância numa superfície, o solvente que inchou as microesferas evaporava e estas voltavam ao tamanho original.

Este adesivo tinha características muito diferentes dos adesivos com que Silver trabalhava, visto que este novo adesivo formava uma superfície descontínua, ao contrário dos habitualmente produzidos na 3M. É claro que, inicialmente, a empresa não tinha nenhum projecto em mente para o novo adesivo. Mas houve um estudo no sentido de encontrar uma aplicação com potencial para criar novos produtos.


Só seis anos depois, em 1974, um engenheiro químico da mesma empresa, de nome Art Fry, teve a brilhante ideia de utilizar o adesivo num marcador que fosse removível. Essa ideia ocorreu-lhe enquanto ele cantava no coro da sua igreja. É neste momento que o projecto Post-it se inicia. A superfície irregular do adesivo, característica incomum em adesivos, permite que apenas uma parte deste entre em contacto com a superfície de colagem. Ora, se uma menor área de adesivo se liga com a superfície, a remoção do mesmo torna-se substancialmente mais fácil.

Ora, fica provado que, em química, acidentes e coincidências nem sempre são maus...

sábado, 22 de outubro de 2011

Uma nova tabela periódica no ano internacional da química!

Neste post do blog pretendo dar conta de um artigo da minha autoria que foi publicado na revista Química, o Boletim da Sociedade Portuguesa de Química.

Este e outros artigos podem ser consultados on-line, gratuitamente, no seguinte link na Webhttp://www.spq.ubiktek.pt/revistas/Boletim/BSPQ_N122/BSPQ_N122.pdf.

Fica, seguidamente, uma cópia do reconhecimento do trabalho realizado pelos meus alunos do ano transacto, por mim, pela minha colega de estágio (Eduarda Faria) e pelo meu orientador de estágio (Fernando Pires Basto).


Baseado em D. Ribeiro, “Uma Nova Tabela Periódica no Ano Internacional da Química!”, Química – Bol. S. P. Q. 122 (2011) 25-26.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

A cebola e o choro

Allium cepa! Um nome pomposo para um alimento tão utilizado na gastronomia portuguesa: a cebola. Este alimento tem diversas particularidades que nos fazem utilizá-lo em quase todos os nossos cozinhados. No entanto, provavelmente já deve ter notado que a cebola não tem um cheiro muito activo antes de ser cortada. Contudo, depois de cortada segue-se um cheiro terrivelmente forte que amiúde nos faz chorar.

Os compostos libertados que nos fazem chorar são os mesmos que protegem a cebola de elementos de níveis superiores da cadeia alimentar. A formação destes compostos é o resultado da acção de uma enzima que está isolada em bolsas, a alinase. Quando a cebola é cortada, as bolsas que contêm as enzimas são também rompidas. Por acção da alinase, os sulfóxidos de aminoácidos (derivados da cisteína) presentes noutras bolsas isoladas e rompidas reagem formando ácidos sulfénicos.


Estes ácidos possuem uma grande volatilidade e, por isso, são libertados como gases que reagem com a água presente nos nossos olhos, formando ácido sulfúrico em muito baixas concentrações. Todavia, apesar de se formar com concentração baixa, este ácido irrita imediatamente os terminais nervosos nos nossos olhos. A resposta imediata do nosso organismo é a de diluir os ácidos nos nossos olhos e, para isso, produz água em excesso para o efeito (as lágrimas).

Ora, se a produção de água pelo nosso organismo é a primeira linha de defesa contra este efeito, então cortar cebolas debaixo de água corrente minimiza os efeitos nos receptores nervosos dos nossos olhos. Se preferir, pode também utilizar óculos de natação para que o gás não chegue aos seus olhos, embora isso talvez seja pouco prático.


No entanto, uma solução inusitada mas eficaz é colocar a cebola no congelador antes de ser cortada (cerca de 1 hora). Isto acontece porque a actividade enzimática da alinase diminui com a diminuição da temperatura. Ao cortar uma cebola muito fria, a actividade da alinase é minimizada e, consequentemente, a produção do gás que nos provoca as lágrimas é francamente diminuída.

Baseado no livro "A cozinha é um laboratório" de Margarida Guerreiro e Paulina Mata.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Por que o vinho se estraga depois de aberta a garrafa?


A partir do momento em que se abre uma garrafa ou pacote de vinho, este passa de imediato a estar em contacto com o ar. Neste momento começa a ocorrer um processo muito comum na Natureza: a oxidação. A oxidação do vinho é o resultado de uma panóplia de reacções química que ocorrem com a participação do oxigénio atmosférico. O oxigénio reage com certas substâncias constituintes do vinho transformando-as noutras com características diferentes. 

Numa fase inicial, o processo oxidativo é conveniente visto que permite ao vinho assumir aspectos diferenciados do seu sabor a respectivos aromas. No entanto, ao cabo de algumas horas, as reacções de oxidação introduziram no vinho substâncias que fazem com que este assuma características indesejáveis, especificamente diferenças substanciais no sabor e aromas, tornando o vinho menos apelativo.


Se se deixar prolongar este processo oxidativo, o vinho pode tornar-se mesmo intragável sem, no entanto, implicar algum risco de saúde grave. O oxigénio atmosférico pode, por exemplo, reagir com o álcool do vinho originando acido acético e água (produtos pouco convenientes para a conveniente degustação de um bom vinho).

Mesmo que tentemos rolhar muito bem a garrafa, o ar que fica retido na mesma é suficiente para que a oxidação do vinho se processe. Posto isto, como será possível conservar vinho nas melhores condições, mesmo depois de aberto? Existem diversos processos para melhorar substancialmente as condições de conservação de um vinho.

É conveniente, por exemplo, depois de rolhar bem a garrafa, colocá-la no frigorífico. As reacções químicas de oxidação do vinho são, grosso modo, endoenergéticas. Isto significa que se fornecermos energia (por exemplo, calor) ao vinho, a oxidação é bastante mais rápida. Por isso, diminuindo a temperatura do vinho, inibimos ligeiramente os processos oxidativos inerentes.



Outra técnica que pode ser utilizada é a extracção do ar das garrafas. Actualmente, existem alguns sistemas simples que extraem grande parte do ar da garrafa. Ora, se existir menor quantidade de ar na garrafa, as reacções de oxidação ocorrerão em menor extensão. Numa situação ideal, dever-se-ia extrair o ar da garrafa e colocá-la no frigorífico.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

"Subir na vida"


Decidi colocar este excerto porque a ciência é mais do que a actividade científica. Os cientistas por trás do nome revelam muitas vezes histórias de um interesse extraordinário.

Esse é o caso do físico Richard P. Feynman. Passagens deliciosas sobre a sua vida podem ser lidas no livro "Nem sempre a brincar, Sr. Feynman!"

A passagem que se segue é, a meu modesto ver, sublime! Uma verdadeira lição de vida...



"Uma vez, na década de 50, quando regressava de barco do Brasil, fizemos escala por um dia na Trindade, e resolvi então visitar a capital, Port of Spain. Naquela altura, sempre que percorria uma cidade, interessava-me sobre tudo ver os bairros pobres – a fim de conhecer a vida ao fundo da escala.

Percorri demoradamente a pé as colinas, no bairro negro da cidade. No regresso um táxi parou e o motorista disse: – Eh, cavalheiro! Quer ver a cidade? São só cinco biwi.

Respondi: – Está bem. – E entrei no táxi.

O motorista arrancou logo, começando a subir a caminho de um palácio, dizendo: – Vou-lhe mostrar todos os sítios bonitos.


Disse-lhe: – Não, obrigado; isso é igual em todas as cidades. Quero ver a parte degradada da cidade, onde vivem as pessoas pobres. Já vi o cimo das colinas.

– Oh! – disse ele, admirado. – Tenho muito gosto em lha mostrar. E quando terminamos vou-lhe fazer uma pergunta, portanto peço-lhe que veja tudo com muita atenção.

E levou-me então a um bairro – deveria ter sido um projecto de urbanização – e parou defronte de uma casa pré-fabricada. Não tinha praticamente nada lá dentro. Estava um homem sentado nos degraus da frente. – Vê aquele homem? – disse-me. – Tem um filho a estudar para médico em Maryland.

Depois escolheu mais alguém dali para que eu pudesse ver como viviam. Era uma mulher com os dentes todos podres.

Lá mais adiante, parámos e apresentou-me a duas mulheres que admirava. – Conseguiram arranjar dinheiro para comprar uma máquina de costura e agora fazem vestuário para as pessoas daqui. – anunciou, orgulhoso. – Quando fez as apresentações, disse: – Este homem é professor, e o mais interessante, é querer ver os nossos bairros.


Vimos muitas coisas, e no fim o motorista do táxi disse-me: – Agora, Professor, aqui vai a pergunta: viu que os indianos são tão pobres, ou às vezes ainda mais, como os negros, mas conseguem lutar para subir na vida de algum modo – este homem mandou o filho para a universidade; aquelas mulheres montaram um negócio de costura. Mas a minha gente não passa da cepa torta. Porquê?

Disse-lhe, logicamente, que não sabia – que é a minha resposta a quase todas as perguntas –, mas não a aceitou, vinda de um professor. Procurei arranjar qualquer motivo que me parecesse plausível e acabei por lhe dizer: – Há na Índia uma longa tradição subjacente à vida, que provém de uma religião e de uma filosofia de milhares de anos. E estas pessoas, embora não estejam a viver na Índia, continuam a transmitir essas tradições sobre os aspectos importantes da vida – tentando construir para o futuro e apoiar os filhos no esforço – que lhes foram chegando ao longo dos séculos.

Prossegui: – Penso que, infelizmente, a vossa gente não teve oportunidade de desenvolver uma tradição tão longa ou, se alguma vez o fez, perdeu-a em consequência da conquista e da escravatura. – Não sei se seria verdade, mas era o meu palpite.


O motorista do táxi achou que era uma boa observação e disse que também planeava construir um futuro: apostara algum dinheiro nos cavalos, e, se ganhasse, compraria o seu próprio táxi e ficaria muito bem de vida.

Tive pena dele. Disse-lhe que apostar nos cavalos era uma péssima ideia, mas ele insistiu em que não havia outra alternativa. Boas intenções não lhe faltavam, só que o eu método ia ser o recurso à sorte.

Resolvi ficar por ali com as especulações, e levou-me ao local onde havia uma charanga a tocar uma música calipso óptima, que m proporcionou uma tarde muito agradável."

Excerto retirado do livro "Nem sempre a brincar, Sr. Feynman!"

domingo, 9 de outubro de 2011

Escurecimento enzimático


Depois de prepararmos uma salada de fruta com pêras, bananas, maçãs e pêssegos verificamos que a fruta começa a ficar escura. Por que tal acontece? A verdade é que se acrescentar sumo de laranja à salada, as frutas já não escurecem. Por que será? Como podemos então evitar que as frutas não escureçam? E será sempre indesejável o escurecimento das frutas?

O escurecimento verificado corresponde a uma reacção de oxidação que ocorre em frutas e vegetais. Quando em contacto com o oxigénio do ar, ocorre a transformação de compostos fenólicos (substâncias encontradas em vegetais e frutas) em polímeros coloridos (moléculas de melanina). Essa reacção pode causar mudanças indesejáveis. Além do escurecimento da superfície da fruta ou verdura pode ocorrer a deterioração de aroma e a diminuição do valor nutricional de muitos alimentos.

Quercetina. Composto fenólico encontrado nas maçãs.

É digno de nota que este fenómeno acontece somente em alimentos ricos em compostos fenólicos, substâncias incolores, que sofrem oxidação quando em contacto com o oxigénio do ar. Esta reacção é catalisada por uma enzima chamada polifenoloxidase, presente nos cloroplastos das células do fruto, formando orto-quinonas e água. Estes produtos reagem espontaneamente entre si formando moléculas de melanina que possuem uma coloração característica castanho-escura.

Esquema da estrutura da superfície molecular da polifenoloxidase.

O que acontece é que, ao cortar frutas como maçã, pêra, banana, tâmaras, cacau, batatas, mandioca e vagem, entre outros, ocorre o rompimento das células e, posteriormente, a libertação de vários exemplares da polifenoloxidase. Deixando-os em contacto com o oxigénio por alguns minutos ele escurecem ficando com manchas castanhas.

O escurecimento enzimático pode ser usado de forma desejável pela indústria de alimentos, na maturação de tâmaras, processamento de cidras, fermentação de chás, secagem de grãos de cacau, desenvolvimento de cor e sabor do chá e do cacau e protecção contra micronutrientes.

Ao manipular frutas e verduras, para que essas não escureçam, podem utilizar-se gotas ou sumo de frutas cítricas como limão e laranja, diminuindo dessa forma o pH da fruta, retardando a influência da enzima que desencadeia o escurecimento.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O termómetro e a constante de Boltzmann

Para os físicos, uma medição de temperatura é mais do que ler uma coluna de mercúrio, ou de álcool. A unidade absoluta de temperatura é o kelvin e foi definida como sendo 1/273,16 da diferença entre o zero absoluto e o ponto triplo da água — que corresponde ao par de pressão/temperatura em que as fases sólida, líquida e gasosa coexistem. Um kelvin corresponde ao incremento de um grau na escala Celsius.

O conceito de temperatura corresponde a uma medida da energia cinética média das partículas de um determinado corpo. A temperatura pode ser medida utilizando termómetros vulgares, que se baseiam na expansão térmica de um líquido.


No entanto, físicos inventaram um dispositivo electrónico capaz de medir a temperatura de um corpo. Esta medida utiliza uma relação interessante entre a temperatura de um corpo e uma constante universal — a constante de Boltzmann, valor relacionado à energia cinética das partículas.

O dispositivo baseia-se no facto de que numa matriz de junções do tipo móvel — camadas finas de isolantes, prensadas entre eléctrodos — a variação da condutância eléctrica é directamente proporcional ao produto da constante de Boltzmann pela temperatura.

Embora este tipo de termometria baseada no bloqueio de cargas eléctricas já apareça em alguns dispositivos específicos, as flutuações nas propriedades electrónicas tornavam as versões existentes pouco confiáveis a temperaturas muito baixas.

O termómetro criado por cientistas da Universidade de Tecnologia de Helsínquia funciona até 150 milikelvins. Físicos finlandeses acreditam que se poderá massificar a produção deste tipo de termómetros muito em breve.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Uma peça de teatro sobre segurança no laboratório

Por que não reflectir um pouco nas asneiras que muitos fazem nos laboratórios de Química?
Nada melhor do que a adaptação em português, da minha autoria, de uma peça de teatro que pode ser representada em qualquer escola:


Uma rapariga, vestida com roupa nova e sandálias, encontra-se numa bancada de laboratório desorganizada com uma mala e uma lancheira. Um rapaz, de calções e sandálias, entra e cumprimenta-a. Eles são companheiros de laboratório e têm que realizar uma experiência, relativa a uma aula a que faltaram. Foram para o laboratório sem conhecimento do professor. Ela estava a usar os óculos de segurança como bandelete, enquanto aquecia um tubo de ensaio (com a boca virada para ela), cheio de um líquido colorido, sobre uma chama muito alta de um bico de Bünsen. Junto do bico de Bünsen encontra-se um frasco de um reagente com o rótulo “ÉTER”.

Ela: Caramba, pensei que nem vinhas, por isso fui começando a experiência.

Ele: Desculpa o atraso mas o meu prof. nunca mais se calava. Preciso mesmo de fumar um cigarro. Tens lumes?

Ela acende o cigarro dele com o bico de Bünsen. Ele depois coloca o cigarro aceso perto do frasco de éter.

Ela: Olha, eu trouxe alguns snacks para comermos durante a tarde. Queres um? Toma lá umas batatas fritas.

Ele: Obrigado, estou esfomeado... ... ... Bah, estão sem-sal. Tens aí sal?

Ela: Sim, um destes reagentes é cloreto de sódio.

Ela olha para dois frascos que contém sólidos brancos.

Vamos lá ver qual deles é que é.

Eles colocam os dedos dentro dos frascos e provam cada um dos sólidos.

Se quiseres, tens aqui um sumo para partilharmos.

Enquanto ele abre o refrigerante e coloca quantidades iguais em duas provetas limpas, ela põe batom.

Ele: Bem, acho que é melhor começarmos porque senão nunca mais saímos daqui. Sabes qual é a experiência que temos que fazer?

Ela: Sim acho que é aquela sobre titulações. Trouxeste o teu manual de laboratório? Esqueci-me do meu.

Ele tira o livro da sua mochila e dá-lhe. Ela folheia o livro e encontra a experiência.

Aqui está. Titulações ácido-base. Aqui diz que é preciso pipetar 25 mL de ácido clorídrico para um Erlenmeyer. Qual deles é que é?

Ele pega num frasco (já com a boca partida), depois muda de ideias, pousa o frasco no sítio e resolve pegar noutro que não está partido.

Ele: Aqui está.

Ela: Ok.

Ela lê um pouco mais no manual.

Porque não fazes isso enquanto eu encho uma bureta com a solução de hidróxido de sódio?

Ele pipeta o ácido com a boca directamente do frasco do reagente. Ele deixa a rolha do frasco na banca. Ao encher a bureta, ela derramou hidróxido por toda a bancada e limpou tudo com as mãos, colocando o excedente de hidróxido no frasco do reagente. Entretanto continua a ler o procedimento no manual.

Agora aqui diz para diluir o ácido com 30 mL de água e misturar bem.

Ele mede o volume de água e coloca na solução ácida.

Ele: Arranja-me qualquer coisa para agitar.

Ela entrega-lhe o termómetro, e ele mexe o ácido e a água com ele. Ele limpa o termómetro na sua camisa.

Ela: Agora temos que adicionar gradualmente o hidróxido ao ácido até ao ponto final.

Ela começa por adicionar rapidamente hidróxido da bureta mas não verifica mudança de cor. Eles continuaram a adicionar até esvaziar a bureta.

Ele: Caramba, isto não parece estar a funcionar. Deve haver qualquer coisa de errado com estes compostos.

Ele tira a rolha dos frascos de reagentes e começa a cheirar.

Humm... Parecem-me ok. Tens a certeza que leste todo o procedimento?

Ela folheia freneticamente o manual de laboratório.

Ela: Penso que li tudo. Ah! Se calhar esquecemo-nos de alguma coisa. O que é um indicador?

Ele: Isso quer dizer que vamos ter que começar tudo de novo?

Ela começa a olhar para o peróxido de hidrogénio e para o iodeto de potássio.

Ela: Humm... Vamos nos divertir um bocado. Gostava de saber o que acontece quando misturo estes dois compostos.

Ela coloca cerca de 50 mL de H2O2 num gobelé de 100 mL que tinha 5 mL de detergente para a loiça.

Ele: Acho que não devias fazer isso.

Ela: Oh, não te preocupes. Os professores não devem deixar nada perigoso no laboratório, não achas?

Ela adiciona uma espátula de KI ao gobelé. Eles observam espantados enquanto uma grande coluna de espuma sobe e transborda o gobelé.

Ele: Oh!!! Acho que é melhor livrarmo-nos das provas e voltar noutro dia.

Eles viraram tudo pelo esgoto da banca e saíram sem lavar o material.

Adaptado de Patricia S. Hill, Thomas G. Greco, J. Chem. Educ.72 (12), 1126 (1995).