Sabe-se
que água e azeite não se dão, não se misturam. Se misturarmos água e azeite,
após algum tempo, a mistura separa-se em duas fases, a água em baixo e o azeite
em cima. Será então possível que as moléculas de azeite e as de água
estabeleçam uma ligação para formarem algo?
A
maionese é feita a partir de gemas de ovo, vinagre e azeite. As gemas de ovo
contêm bastante água na sua composição, cerca de 50 %, e o vinagre é
constituído quase só por água. Então como podemos conseguir uma emulsão, a
maionese, a partir de água e azeite? Para compreender este facto, nada melhor do que um divertido diálogo imaginário entre os intervenientes:
Vinagre - Chamo-me vinagre, nome
que me vem directamente do meu pai – o vinho. Vinagre quer dizer “vinho acre”
(ou vinho azedo) e, na verdade, eu mais não sou de que um vinho modificado por
certos micróbios – as bactérias Acetobacter – que transformam o álcool etílico
em ácido acético. Por vezes
sou mal interpretado, porque quando “me chegam cá os azeites” é que se vê a
minha acidez... Mas sou um óptimo conservante; consigo impedir que os
micróbios se desenvolvam nos alimentos.
Azeite - O meu nome é
azeite, e a minha mãe é a azeitona. A minha tristeza é que, para eu vir ao
mundo, ela teve que ser toda espremida. Mas já se sabe que dar à luz nunca é
fácil. Sou da família das gorduras (os químicos chamam-nos lípidos), tenho
montes de ácido oleico e dou aos alimentos a possibilidade de ficarem mais
macios e de serem cozinhados a temperaturas mais elevadas do que com a água.
Por isso, ficam mais saborosos.
Vinagre - Alto lá! Já me
estás a insultar! Sim, porque eu sou mais água do que ácido; aliás sou mesmo
quase só água. E também te digo que, com a água, os alimentos ficam mais
saudáveis, mantêm os sabores originais e são muito melhores para as pessoas
doentes. E, já agora, se há coisa que detesto é mesmo a gordura. Contigo não
quero ligações, não tens nada que me atraia.
Azeite – Olha, meu caro, esse teu
ódio é 100 % correspondido. Sempre que encontro água, junto-me logo às gorduras
minhas amigas e fazemos uma roda onde tu não entras nem por nada.
Ovo – Que pena me faz
ouvir-vos nestas zangas constantes! É que no mundo da cozinha nem há bons, nem
há maus. Todos somos necessários e temos é que trabalhar em conjunto. Eu, como
sabem, também tenho muita água e gordura (para além de proteínas e outras
coisas que tais), vivo bem satisfeito e sou muito apreciado. Chamam-me para
montes de pratos. Quem sabe
se juntos não poderemos fazer uma associação deliciosa, bonita e útil? Eu tenho
uma molécula – a lecitina – que penso que pode entrar em conversações convosco
e tentar pacificar as vossas relações. Já tem feito bom trabalho noutras
situações; é uma conciliadora nata, quase uma mensageira da paz... E tenho
também umas proteínas nos ovos que fazem um trabalho semelhante e com bons
resultados.
Lecitina – Ouvi falar no meu nome,
chamaram-me? Ai, já estou a ver o que se passa. É mais uma vez o vinagre e o
azeite a implicarem um com o outro. Isto das polaridades tem mesmo que se lhe
diga; vocês são realmente imiscíveis! Mas eu sugeria-vos uma coisa. Sou
assimétrica e tenho 3 braços. Não é que seja bonito, mas acaba por dar jeito
nalgumas situações. E posso tentar estabelecer uma ligação com o azeite com os
meus dois
braços mais compridos e com o outro dava a mão à água. Outros familiares meus,
os detergentes, já têm feito isto e tem resultado. Que dizem?
Azeite - À partida vou desconfiado,
digo já. Sou como os gatos, desconfio sempre da água e como o vinagre é mais
água que outra coisa... Não é coisa que me entusiasme, mas...
Vinagre - Cá por mim posso tentar,
mas se vejo o azeite a juntar-se, gota a gota, sou eu mesmo que o atiro ao ar
e, como é tão leve, vai por fora que é um mimo.
Lecitina – Bom, parece-me então que
podemos experimentar. Que tal? Mas volto a lembrar, nada de grupinhos!
E foi assim criada uma associação perfeita, tão a
gosto de todos nós… a MAIONESE!!!
Baseado em Guerreiro,
Margarida; Mata, Paulina. A Cozinha é um
Laboratório. Lisboa: Fonte da Palavra, Lda. 2ª ed. (2010).
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